terça-feira, 12 de outubro de 2010

JSB 03

A GRANDE TRAVESSIA. O último dia nas Cocos islands, um Domingo, foi passado na West Island para onde fomos num ferry que, excepcionalmente nos foi buscar ao sítio onde os barcos estavam ancorados. Oportunidade para ir ao supermercado fazer os últimos aprovisionamentos para a próxima etapa, ir à internet no escritório do turismo local que estava aberto só por nossa causa e seguir para um barbecue onde nos serviram uma carne fantástica, australiana, grelhada nas brazas mas metida dentro de uns vulgaríssimos pães de hambúrguer, fazendo-me pensar que não há nada melhor que o pão alentejano. E depois disto, e como se não estivéssemos de barriga cheia, tivemos a oportunidade de participar numa festa da comunidade local, chamada “cheese & wine festival”. Muito animada, com alguns cheeses e muito wine e música ao vivo desempenhada por um conjunto de três aborígenes, daqueles mesmo muito feios, que depois de uma música muito interessante que falava das suas origens e da sua vertente animista (the winds are my spirit and the waters reflect my dreams…) com uma dança adequada a acompanhar, nos surpreenderam com um reportório de músicas completíssimo que pôs toda a gente a dançar e a pular. Tudo muito animado porque cada um tinha um cartão que lhe dava direito a dez bebidas… eu só bebi três mas houve quem as bebesse todas e mais algumas o que fez com que o regresso aos barcos tivesse sido uma viagem muito divertida. Tudo isto se passa ao ar livre, apenas com umas tendas de pano por cima das nossas cabeças, e no meio de fortíssimas chuvadas tropicais. E como estamos mesmo num clima tropical, era ver as crianças da comunidade a saltarem para a chuva, divertidíssimas, encharcadíssimas, com os pais, embevecidos e protegidos debaixo das tendas… Isto passava-se na véspera da nossa partida. Chegámos ao barco pelas 18,30, já noite, e, como eu tinha deixado a janela da minha cabine meio aberta, porque de manhã estava bom tempo, tinha tudo ensopado pelas chuvadas que tinham caído durante o dia. E no dia seguinte partimos para a etapa das 2.350 milhas náuticas (cerca de 5.000 Kms) até à Ilha Maurícia. E aqui, o Índico fez-me pagar caro a minha ousadia de o desafiar. Apanhei a etapa mais difícil que o Thor VI encontrou desde a sua saída de Lisboa no ano passado. Tivémos oito dias (8) seguidos com um vento superior a 30 nós (+50Kms/h) com ondas de 4 a 6 metros e, nalgumas vezes o vento ainda passou os 35 nós e chegou aos 40, com alguma chuva pelo meio… Uma experiencia fantástica. Já tinha tido anteriormente o prazer de apanhar algumas horas de vento constante e certinho que fazia o meu barco andar veloz e ligeiro ao longo da nossa costa. Mas oito dias seguidos, sem interrupção!!! Apanhámos então os alíseos do hemisfério sul, do quadrante Sueste que nos entravam quase pela poupa arrasada, acompanhados de uma ondulação também pela alheta de bombordo e de uma vaga incerta e inconstante que nos proporcionou uma média fantástica de mais cerca de 170 milhas por dia, mas uma mareação desconfortável, difícil e cansativa. Depois o vento baixou um bocadinho, primeiro para os 25 e depois para os 20 nós e só no último dia, precisamente aquele em que estamos desejosos de chegar, é que caiu obrigando-nos a uma últimas horas de motor. E assim passaram 14 dias. No meio disto tudo, navegámos, dormimos, cozinhámos e estabelecemos uma rotina que fazia passar os dias. E há tempo para tudo, para ler, para pensar, para fortalecer recordações, para ver uma vida que começou há tanto tempo mas que continua, para estabelecer novos horizontes pessoais. Mas foi uma travessia heróica!! Não há dúvida que a principal razão que me levou a entrar nesta aventura é mesmo válida: aproveitar uma oportunidade que, decerto, não voltaria a ter. A primeira impressão da Maurícia é boa. Muito movimento, muita gente, quase todos indianos mas com hábitos ocidentais bem patentes e enraizados e um aspecto de terra desenvolvida e pujante com muita actividade. Mas isto é só uma primeira impressão. Depois contarei mais. Saudades a todos

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